terça-feira, 13 de maio de 2014

O 13 de maio e a verdadeira abolição


As cotas e a disribuição de renda desorganizarão o sistema de dominação das elites e a verdadeira abolição chegará, aos trabalhadores negros e não negros.

E eles chegaram, um dia, e depois outro, e por séculos, continuaram chegando, transportadoras em navios fétidos, podres e desumanos. No outro lado do Oceano deixaram seus roçados, suas famílias e suas formas de vida.
Aqui nestas terras, a morte rápida e certeira, em canaviais, troncos e senzalas. Estupros, castigos e um novo deus, uma nova submissão. Suas mãos e seus pés, artísticos e trabalhadores, edificaram a Pátria Continente Brasil e, em troca, nunca, nada!
Há 124 anos, a Princesa Isabel assinou a Lei Áurea, pondo fim à escravidão no Brasil. De fato, ninguém mais poderia comprar ou vender negros, ninguém poderia ser dono de negros. No mais, o que já conhecemos: mera formalidade, como a chamada democracia brasileira. Está no papel, mas só lá.
Depois de 1888, nenhuma terra, nenhuma escola, nenhum emprego, apenas as favelas e o braço da lei para punir os que não aceitassem a modelagem social que lhes cabia.
O Negro fez o Brasil, conquanto nossos índios e brancos jamais possam ser ignorados. O Negro ensinou a toda gente a “língua brasileira”, o Negro povoou a culinária, a dança e o canto. O Negro contagiou nossa música e nossas festas, o Negro nos ensinou a arte de sorrir e de gingar.
De trabalho em trabalho, de sol a sol, surra a surra, muitos foram morrendo, mas ainda assim, a fantástica força cultural do Negro manteve sua vitalidade. Reinventou-se, se moldou, e não morreu, nunca morrerá, porque agora esta é a força do Brasil.
Quando o Negro virou prejuízo, o expulsaram da senzala e cinicamente chamaram a isto de Abolição. Vagou por estradas, sem terra, emprego ou escola. Povoou morros e favelas, e excluído, ainda criou um mundo paralelo à sociedade para sobreviver. A sociedade absorveu as contribuições culturais negras, mas levantou muralhas sociais e econômicas intransponíveis à civilização negra.
O Negro foi e sempre será importante ao Brasil, mas ele ainda não se vê nas revistas nem outdoors, o Negro não está na TV, nem nos empregos mais cobiçados, social e economicamente. Nas universidades uma minoria, ínfima, é negra, embora, sob os governos petistas, o percentual tenha saltado de 3%, para 17%.
Miseravelmente, a barbárie social e cultural sofrida pelos negros não é capaz de convencer as cabeças mais atrasadas e preguiçosas sobre a necessidade, ainda que provisória, de uma política de cotas no Brasil. Vou mais longe e defendo cotas na TV e nas propagandas, onde só aparecem brancos, como se nosso país não tivesse metade da população afrodescendente.
Vamos à essência do problema, as cotas e a distribuição de renda exigirão, muito em breve, que as classes dominantes remodelem seus esquemas de dominação e, isso, obviamente, inquieta e assusta. A verdadeira abolição chegará, mas só será verdadeira quando abolir a opressão sobre os trabalhadores brasileiros, negros e não negros.

Sobre o(a) autor(a)

Fábio Chagas

sepechagas@yahoo.com.br

Doutor em História e professor universitário

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