quarta-feira, 30 de abril de 2014

Conheça 'Canções para Helena'



 Canções para Helena
A Associação ‘Olhar Down – Amor sem limites’ nasceu da necessidade de visibilidade socias das pessoas portadoras da Síndrome de Down. Uma bela iniciativa para a inserção dessas pessoas na sociedade. Com um olhar totalmente consciente, sem aquela conotação preconceituosa que há muito tem sido usado, de que são pessoas ‘especiais’ e precisam de privilégios. Não! Mais do que nunca provam que são pessoas comuns. Extremamente interessantes. Ativas. Sociáveis. Amáveis. Participativas.
O interesse da Associação é realizar oficinas, cursos, projetos, vínculos sólidos com o mercado de trabalho. Trabalhando contra o preconceito. Pensando assim, nada melhor que a música para ajudar nesse sentido. Segundo pesquisadores, ‘a música desempenha um papel importante na vida dos seres humanos. É uma linguagem universal que ultrapassa barreiras geográficas e culturais fazendo-se presente em todas as épocas ao longo da história’. Sim! ‘Quanto maior for o envolvimento da criança com a música, maiores serão os seus benefícios. Pesquisas comprovam que adultos que estiveram expostos a experiências musicais na infância têm um maior desenvolvimento intelectual, motor, afetivo e cognitivo. Comprovadamente, a prática da música, seja pelo aprendizado de um instrumento ou apenas pela interação e apreciação, potencializa a aprendizagem cognitiva em vários campos, como a memória e os raciocínios lógicos e abstratos’.
Sendo assim, conheça o Projeto ‘Canções para Helena’. Na sua página você encontrará vídeos, canções, planos de aula, letras de músicas e dinâmicas utilizadas neste projeto. Conhecerá crianças, pais, amigos ‘felomenais’, como dizia o saudoso personagem Improtta. E poderá ajudar outros através da música. Participe com seus comentários. Nos envie sugestões. Poderemos construir juntos um amanhã melhor, futuros adultos musicais. Acompanhe esse trabalho! Conheçam o blog Canções para Helena.

terça-feira, 29 de abril de 2014

A dor e a delícia de ter um espírito livre

Amanda Viaja


mulher-que-viaja
A pessoa de espírito livre vive um grande dilema. Sofre por ter que ouvir um “de novo?” quando diz que vai viajar no mês que vem, sofre por tentar convencer as pessoas de que é normal viajar tanto. Mas ao mesmo tempo, é a pessoa mais feliz do mundo quando viaja, sempre achando que aquele é o lugar mais lindo que já esteve. Mesmo tendo estado em outros lugares “mais lindos do mundo”.
Não é fácil ter um espírito livre. As pessoas não estão acostumadas. Continuam achando que o normal é apenas o pacote: estudar, trabalhar, namorar, casar e ter filhos. E qualquer coisa fora disso, você desandou.
Mas ser normal tem um conceito diferente para cada um. Deixa eu explicar… Por exemplo, se você sonhou a vida inteira em casar e ter filhos, isso é normal para você. Eu nunca sonhei com isso, portanto me parece a coisa mais normal do mundo não ter filhos. Ou então para você pode ser normal todas as noites depois do trabalho, se dedicar à pintura de um quadro. Pra mim não é, simplesmente porque nunca pretendi fazer isso. Mas não vamos tentar um convencer o outro do contrário, ok? O legal é respeitar. Eu já me vi em conversas com as minhas amigas sobre as flores que deveriam usar no casamento delas. E, me desculpe, mas eu não tenho a mínima ideia ou interesse em decoração de casamento. Mas as respeito e ainda dou minha opinião feliz da vida quando solicitada.
E quem está te falando tudo isso não é uma mochileira-hippie-doidona-uhu, mas uma mulher formada em Engenharia, com uma carreira internacional, que fez MBA e hoje é gerente em uma das empresas mais conhecidas do Brasil. Quer coisa mais “normal” do que isso? Mas mesmo assim eu não convenço as pessoas. E me nego a abandonar meu espírito livre, seguindo com meu dilema da dor e delícia de ser assim.

DOR

As pessoas podem não te levar tão a sério. Minha técnica para provar que elas estão erradas a meu respeito foi sempre estudar, ter uma carreira bacana, ser educada… tudo para esconder meu espírito livre e para me darem um pouco de razão. Mas tentar provar que você não é uma louca o tempo todo cansa, né? Aí parei.


Sua família pode discordar do seu estilo de vida. Meses atrás quando mudei de emprego, cogitei comprar um carro pois meu trabalho fica longe de casa. Meu pai disse que se eu não tivesse ido a Machu Picchu e Cancun, teria conseguido comprar um. Assunto encerrado. Hoje ando de ônibus feliz e contente. Não troco nenhuma das minhas viagens por nada.

Pode ser difícil encontrar um namorado(a). Até um tempo atrás eu escondia dos homens o quanto queria viajar para lugares inóspitos, morar fora do país de novo e até que não estou preocupada com casamento e filhos. Tudo isso sempre assustou aqueles de “vida normal”. Mas hoje não escondo mais nada. Na verdade, serei infeliz se me relacionar com alguém que não me conhece de verdade. E ainda tem a questão de afinidade: provavelmente, não vou me apaixonar se ele tiver uma vida normalzinha e não gostar da minha vida maluquinha.

DELÍCIA


Você tem amigos em qualquer parte do mundo. Quando você viaja e abre sua mente para o novo, você se comunica, conhece pessoas novas e interessantes e que podem se tornar amigos para sempre. Sabe aquela viagem que você quer fazer pra Europa? Então, que tal ficar na casa daquela amiga londrina que você conheceu na última viagem? E as dicas sobre a Índia com aquele seu amigo indiano?

Você se torna uma pessoa mais interessante. Apesar das pessoas não te darem moral com as suas ideias muito “loucas”, acredite: elas vão ouvir as suas histórias com brilho nos olhos e até um pensamento de “puxa, se eu tivesse coragem…”. Sem contar, que você sempre terá assunto em qualquer lugar, com qualquer pessoa, em qualquer situação.

Os relacionamentos amorosos são menos tediosos. As pessoas de espírito livre quando se encontram, naturalmente planejam aventuras, finais de semana interessantes e viagens dos sonhos juntas. E de tanto se aventurarem por aí, ficar em casa tranquilas vendo um filminho, já é sair da rotina.

Mas enquanto você decide o que é normal e o que não é, se deve assumir seu espírito livre ou não, se casa ou compra uma bicicleta, se sai do seu emprego insuportável ou daquele relacionamento infeliz com aquela pessoa que não te deixa fazer nada, vou ali comprar minha passagem para aprender a surfar na Costa Rica. Depois te conto como foi.

Sobre a autora: Este post foi originalmente publicado no meu blog Be happy now mas achei que seria uma ótima maneira de me apresentar aos leitores do Estadão. É com muito prazer que a partir de hoje começo a escrever aqui no Amanda Viaja. Espero que você goste e que me acompanhe nessa nova jornada.
Se quiser, pode me acompanhar também através do Instagram @amandanoventa e no Facebook clicando aqui.

Ilustração: Christopher Silas Neal

segunda-feira, 28 de abril de 2014

Feminismo negro: sobre minorias dentro da minoria


Feminismo negro: sobre minorias dentro da minoria

As necessidades das mulheres negras são muito peculiares e sem que seja feita uma profunda análise do racismo brasileiro, é impossível atender às urgências do grupo

Por Jarid Arraes

A origem
O Feminismo Negro é um movimento social e um segmento protagonizado por mulheres negras, com o objetivo de promover e trazer visibilidade às suas pautas e reivindicar seus direitos. No Brasil, seu início se deu no final da década de 1970, a partir de uma forte demanda das mulheres negras feministas: o Movimento Negro tinha sua face sexista, as relações de gênero funcionavam como fortes repressoras da autonomia feminina e impediam que as ativistas negras ocupassem posições de igualdade junto aos homens negros; por outro lado, o Movimento Feminista tinha sua face racista, preterindo as discussões de recorte racial e privilegiando as pautas que contemplavam somente as mulheres brancas.
O problema da mulher negra se encontrava na falta de representação pelos movimentos sociais hegemônicos. Enquanto as mulheres brancas buscavam equiparar direitos civis com os homens brancos, mulheres negras carregavam nas costas o peso da escravatura, ainda relegadas à posição de subordinadas; porém, essa subordinação não se limitava à figura masculina, pois a mulher negra também estava em posição servil perante à mulher branca. A partir dessa percepção, a conscientização a respeito das diferenças femininas foi ganhando cada vez mais corpo. Grandes nomes da militância feminina negra foram fazendo história, a exemplo de Lélia Gonzalez e Sueli Carneiro. A atenção e a produção de conteúdo foram dedicadas a discussões de raça e classe, buscando romper uma zona de conforto que o ativismo feminista branco cultivava, especialmente aquele que limitava sua ótica aos problemas das mulheres de boa condição financeira e acesso à educação.
No entanto, isso não foi suficiente para que o Feminismo Hegemônico passasse a reconhecer as ativistas negras e resgatasse as memórias das mulheres que lutaram na linha de frente de diversos movimentos sociais. Para as meninas e mulheres que vêm a conhecer os movimentos pelos direitos da mulher, há um vácuo de modelos negros nos quais se espelhar, mas não por falta de pessoas atuantes e sim por causa da invisibilidade. É preciso que haja a iniciativa de buscar figuras inspiracionais, caso contrário os nomes mais celebrados serão extremamente limitados.
Rompimento e necessidade do feminismo negro
A cisão das mulheres negras com o movimento feminista hegemônico nunca foi fácil. Por deterem o domínio racial e contarem com maior número de lideranças consolidadas, as feministas brancas resistem às questões das mulheres negras. Grande parte das reclamações relatadas são repetições de um único discurso: as negras criam caso, plantam confusão e discórdia, enxergam racismo onde há boas intenções e não são compreensivas.
Isso acontece porque há a tendência de englobar as mulheres a partir de uma única característica em comum: o gênero. Supondo que todas passam pelos mesmos problemas e desejam as mesmas coisas, o Feminismo que não se atenta para as especificidades de cada grupo feminino acaba atuando sob omissão, muitas vezes deliberada. As necessidades das mulheres negras são muito peculiares e sem que seja feita uma profunda análise do racismo brasileiro, é impossível atender às urgências do grupo.
A luta das feministas negras é uma batalha contínua para nivelar seu lugar ao lugar das mulheres brancas. Isso, por si, levanta a importante reflexão sobre a representação feminina na mídia, seu espaço no mercado de trabalho, o lugar de vítima da violência sexual, o protagonismo da maternidade, entre outros temas, pois se há tanto por que as mulheres brancas precisam lutar, é bastante preocupante o fato de que as mulheres negras nem sequer conquistaram igualdade quando em comparação com outros indivíduos do seu próprio gênero.
Dados, estatísticas
Para contextualizar os abismos raciais que separam as mulheres, é possível usar alguns dados de pesquisas institucionais do IBGE, IPEA e OIT.
. Mercado de trabalho
Em 2013, a PEC 66 foi aprovada, transformando em lei a reivindicação de empregadas domésticas, que há décadas lutavam por direitos trabalhistas. Não por acaso, as mulheres negras compõem a maioria de trabalhadoras do lar (61,7%) e mesmo com o avanço trazido pela Proposta de Emenda Constitucional, a realidade ainda permanece distante do desejado. As funcionárias que exigem seus direitos muitas vezes acabam despedidas e, sob ameaças e assédio moral, é difícil efetivar a conquista.
Enquanto mulheres brancas lutam para que seus salários (média de R$ 797,00) sejam equiparados aos salários dos homens brancos (média de R$ 1.278,00), as mulheres negras recebem ainda menos (média de R$ 436,00). Conseguir um emprego formal, uma boa colocação e ingressar no ensino superior também são dificuldades típicas daquelas que possuem a pele negra.
Outra face perversa do racismo atrelado ao sexismo é a jornada tripla de trabalho. As trabalhadoras se distanciam de seus lares e filhos para que possam prover sustento, muitas vezes cuidando dos filhos das mulheres com melhor condição financeira, e, por não possuírem os recursos, não podem contratar alguém para prestar assistência às crianças e fazer manutenção em suas próprias casas. As creches não atendem à demanda e as funções das mulheres pobres se acumulam. Chegar em casa após um longo dia de labuta e, ainda assim, precisar cumprir mais tarefas domésticas é uma realidade exaustiva que pode ser relatada por milhares de mulheres negras.
. Aborto e direitos reprodutivos
No Brasil, o aborto é legal e gratuito somente se a gravidez for gerada por um estupro, causar risco de morte para a mãe ou no caso do feto ser anencéfalo. Apesar disso, mulheres negras e pobres encontram resistência do sistema de saúde, sendo coagidas por equipes médicas e por religiosos de suas comunidades. Por não contarem com suporte e não terem recursos financeiros que paguem clínicas particulares, muitas dessas mulheres jamais conseguem realizar o aborto.
Se o foco é o aborto por escolha, ainda não legalizado em nosso país, as mulheres negras também integram a parcela de maiores vítimas da ilegalidade. Por causa das complicações geradas por abortos clandestinos, as mulheres negras morrem em números altíssimos e também estão mais vulneráveis ao indiciamento criminal, caso sobrevivam.
A violência obstétrica também é um marco na vida das mães negras e pobres. Negligenciadas nas filas do SUS, elas são colocadas em segundo plano para que mulheres brancas – consideradas mais frágeis e sensíveis – sejam priorizadas, independente da ordem de chegada.
. Violência doméstica e sexual
A cor é fator relevante quando analisamos os casos de agressão e assassinato por parte de companheiros e ex-companheiros. As negras são mais de 60% das vítimas de feminicídio, exatamente porque não contam com assistência adequada e estão mais vulneráveis aos abusos das próprias autoridades.
0  0  0  00 000   feminismoJá no aspecto da sexualidade, das mulheres brancas é esperado o comportamento moderado e sensualidade com limitações, porém, as mulheres chamadas de “mulatas” são amplamente exotificadas e tratadas como objetos disponíveis para a exploração. O argumento de quem enxerga as mulheres negras como mais disponíveis para investidas sexuais é de que elas são mais provocantes, que seus corpos suportam atos mais intensos ou até mesmo que não podem negar os assédios.
A cultura do estupro é vigente desde a colonização do Brasil, quando mulheres negras foram estupradas por homens brancos e usadas em políticas oficiais de miscigenação, com o fim de branquear a população. A mentalidade daquela época se mantém forte na contemporaneidade e é por isso que são tão naturalizados aspectos culturais como a escolha anual da Globeleza. A posição de mulata que expõe seu corpo é tão relacionada exclusivamente à mulher negra, que nem sequer se estende o concurso sexista para mulheres de outras raças.
Enquanto as mulheres brancas também são vítimas de violência e estupro, é preciso salientar as formas distintas pelas quais o machismo atua: as brancas são violentadas exclusivamente por seu gênero, as negras também se tornam vítimas do preconceito racial. Um bom exemplo é a Marcha das Vadias, atualmente realizada em quase todos os estados brasileiros. Há diversos grupos do Feminismo Negro que não participam dos protestos e criticam o uso de palavras como “vadia” e “puta”, afirmando que as mesmas não podem ser ressignificadas pelas negras, pois o estigma que carregam é muito forte e o mais urgente é romper representações hipersexualizadas. Partindo desse pressuposto, o melhor seria lutar para ser reconhecida como ser humano intelectual, capaz de conquistas diversas e ocupação em papéis ilimitados. Não obstante, esse posicionamento não é unânime; diversas mulheres negras participam das marchas e ocupam posições nas equipes de organização.
. Padrão de beleza e mídia
Cabelos lisos e loiros, narizes finos, bochechas rosadas, olhos azuis e axilas claras são alguns exemplos de como a estética ocidental celebra características brancas como melhores e mais belas. Por causa dessa padronização, atrizes negras são minoria absoluta e quase nunca são convidadas para estrelarem na televisão.
Embora a redução da mulher ao papel de “musa” seja machista, vale a pena dedicar um pouco de reflexão ao racismo explícito que passa todos os dias sem muitos protestos. A posição não é ideal para nenhuma mulher, mas as causas que levam a exclusão das mulheres negras são inegavelmente racistas.
. Mulher negra X homem negro
O debate interno dentro do Feminismo Negro e entre pessoas negras sobre as múltiplas faces do machismo é bastante inflamado. Grande parte da luta feminina se dá contra o sexismo, a imposição de papéis e a violência. Só que o problema é ainda mais profundo e há um incômodo severo por parte de muitas mulheres negras, que se sentem rejeitadas pelos homens negros. A ideia de que são sexualmente usáveis e descartáveis é tão forte que a confirmação rompe as paredes dos grupos militantes: o Censo 2010 revelou que as mulheres negras são as que menos se casam, sendo a maioria na categoria de “celibato definitivo”, ou seja, que nunca tiveram um cônjuge.
Essa discussão é muito complexa e delicada, já que perpassa o desconforto em face do racismo e a solidão que as mulheres negras enfrentam. Por isso não é incomum ver protestos e críticas incisivas diante de um rapper ou jogador famoso que apresente sua namorada loira.
Uma outra perspectiva das relações entre mulheres e homens negros se dá pelos âmbitos familiares. Uma mulher branca de classe média dificilmente se preocupará com a violência policial que ceifará a vida do irmão, pai ou filho. Essa é uma pauta muito precisa das feministas negras e revela como até mesmo as relações de gênero se desdobram de maneiras pouco delimitadas pelo puro debate sobre o machismo.
Apesar dos assuntos que dizem respeito à heterossexualidade, há também a necessidade de se abordar as vivências das mulheres negras que são lésbicas e bissexuais, que precisam lidar com investidas invasivas, lesbofobia e discriminação.

A conscientização
Os dados citados são apenas alguns exemplos das disparidades entre mulheres brancas e negras, mas são fundamentais para se compreender a necessidade de uma vertente específica dentro do Feminismo. Afunilar demandas é uma prática comum dentro dos movimentos sociais. Não há porque manter uma falsa impressão de homogeneização quando a diversidade é capaz de produzir muito mais união e potencial comunitário. Reconhecendo e respeitando as diferenças e características subjetivas das mulheres que fazem a luta feminista, é possível contemplar as necessidades urgentes de cada categoria. A diversidade sexual, as variáveis nas identidades de gênero, os fatores de classe, raça e etnia, entre outras especificidades, estão se transformando em abordagens prioritárias que exigem conscientização imediata.
O Feminismo Negro existe, desde seu surgimento, para emergir as questões periféricas repudiadas pelo status quo. Ele é, em primeiro lutar, um ato de resistência motivado pela existência livre. A população negra é mais de 50% do Brasil; portanto, o esquecimento dessas mulheres seria, no mínimo, o esquecimento de uma importante parcela de cidadãs.

Fonte: Site Revista Fórum

domingo, 27 de abril de 2014

Nefasta estatística


Flávia Oliveira

Mortes por homicídios tiram 20 meses da expectativa de vida dos negros do Brasil. Há perdas humanitárias e também econômicas

Quando despencou, baleado, do muro de uma creche na comunidade carioca do Pavão Pavãozinho para a morte, na semana passada, Douglas Rafael da Silva Pereira ratificou uma nefasta estatística. O dançarino DG foi mais uma vítima da quase profecia que aterroriza famílias pobres e negras Brasil afora. No país, assassinatos subtraem 20 meses da esperança de vida dos homens pretos e pardos. No Rio de Janeiro, eles vivem dois anos menos, o nono resultado entre os 27 estados e o Distrito Federal. Se os óbitos não sensibilizam pelo argumento humanitário óbvio, pensemos na economia. São homens que poderiam trabalhar, girar a roda da produção e do consumo. Mas não vão. Alguns, de tão jovens, sequer conseguiram o primeiro emprego.
E morrem cada vez mais novos. “Em 1980, o pico das taxas de homicídios por idade no país se dava aos 25 anos. Em 2010, caiu para 21 anos”, informa o economista Daniel Cerqueira, diretor de Estudos e Políticas de Estado do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Ser jovem e negro no Rio é fazer parte de um grupo de risco, completa o antropólogo Rolf Malungo de Souza, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF). “Se morar em favelas, no subúrbio ou na Baixada, tem de torcer para passar dos 24 anos. DG resistiu um ano mais”, lamenta.
Dados do Ministério da Saúde e do Censo 2010 mostram que a taxa de homicídios dos negros no país é de 36 mortes por cem mil habitantes da mesma cor. O indicador cai a menos da metade (15,2 por cem mil) entre os brancos. Nas contas do Ipea, para cada dois brancos assassinados morrem cinco negros. “Uma pesada herança das discriminações econômicas e raciais contra afrodescendentes no Brasil é a letalidade violenta”, escreveram Cerqueira e Rodrigo de Moura (Ibre/FGV) no paper “Vidas perdidas e racismo no Brasil”, publicado em novembro de 2013.
Os dois pesquisadores encontraram nos tempos da escravidão explicação para o índice alarmante de assassinatos de pretos e pardos. As mortes têm a ver com a alta participação do grupo entre os pobres e os menos instruídos. São pessoas, por isso, mais vulneráveis à violência urbana. A cor da pele, completa Cerqueira, conta também pela visão estereotipada que baliza, por exemplo, as abordagens policiais.
A violência, para Souza, faz parte da construção social da masculinidade no Brasil. Ele estuda o tema desde os anos 1990. “Aqui, os homens se impõem pela violência física ou simbólica. É cultural”, diz. DG foi a vítima da hora, visível pelo emprego que tinha num programa de TV e pela mãe assertiva no discurso por Justiça. Tantos outros tombaram (e tombam e tombarão) sem alarde em crimes de rua, em confrontos entre facções ou pelas mãos da polícia truculenta.
Até a indignação social dar um basta pela via das políticas de respeito aos direitos humanos, o Brasil continuará contando mortos. Em 2012, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foram 99.766 óbitos masculinos por causas violentas (além de assassinatos, acidentes de trânsito e suicídios). Do total, 40.016 tinham de 15 a 29 anos de idade.
Contará também os prejuízos. Cerqueira estima em 2,34% do PIB o custo anual dos homicídios. É muito além do superávit primário que o governo não consegue produzir. É quatro vezes o orçamento do Bolsa Família. E é pouco, diante do valor inestimável de uma vida perdida.

Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/sociedade/nefasta-estatistica-12310468#ixzz306ipyzaO
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sábado, 26 de abril de 2014

'Grória Figena' - um exemplo de bom humor



Detesto ser redundante, mas isso se faz necessário quando envolve o Grupo Ponto de Partida e o que estiver vinculado a tal companhia teatral. Muitos conhecem o trabalho do grupo de longa data, principalmente sua inquestionável arte. É como expressam por aí, ‘tal pai, tal filho’. O Ponto de Partida gerou ‘filhos’ lindos e competentes, com uma bagagem cultural e artística que poucos, ou ninguém, pode colocar defeito. O último contato com seu trabalho, o espetáculo ‘Grória Figena – pelejando no bar’, foi digno de nota e excelentes impressões.
Há algum tempo temos observado a deterioração do humor através de suas piadas cada vez mais pesadas, chocantes e ofensivas. Recebo tais apresentações com total desgosto e desprezo. O espetáculo supracitado, como de praxe na arte do Ponto de Partida, busca a origem, um humor inofensivo, suave, com críticas construtivas, sem exageros, sem estereótipo degradante, respeitoso e pontual. A faxineira, que bem poderia ser minha mãe, retrata o dia a dia de muitas mulheres simplórias que estão por todos os cantos deste país. Seus filhos, que também poderiam ser meus irmãos – e até certo momento pensem que fossem, são os filhos da ‘classe c’, outra diferenciação, que assim como o grande Criolo, não concordo com a classificação, mas é a maneira que a vasta maioria da sociedade compreende a origem social. São os meninos que veem na propaganda os filhos da ‘classe média alta’ dar presentes a seus pais e, muitas vezes, se perguntam de onde vão tirar dinheiro, sem pedir a seus genitores, para presenteá-los. E estes acabam arrumando artimanhas questionáveis para agradá-los. Eis o momento de incutir valores nesses pequeninos. Nem que o meio usado seja ameaçar de os ‘partir ao meio’. Nos faz refletir: A luta diária da mulher brasileira é digna de muito aplauso e admiração.
Por fim, Regina Bertola, em suas breves e valiosas palavras, nos atentou para uma reflexão necessária: trabalhar, contribuir, para uma cidade melhor. Sim! Um ambiente harmonioso, começando por nosso lar. Que tal fazer e cuidar de um jardim em sua casa? Valorizar a história de sua cidade, sua família? Que referência deixará para seus descendentes a respeito de seu passado? O limpará como se nunca tivesse existido? Como contribuirá para um amanhã melhor? Cederá às imposições das grandes redes de entretenimento e desvalorizará a verdadeira arte? Culpará sempre os políticos locais, ou nacionais, pelas mazelas que você permite que ocorra? Muitos questionamentos pertinentes. Apesar de muitos não reconhecer, a arte nos faz refletir sobre quem realmente somos e o que queremos. Basta sensibilidade. Mais uma vez: Obrigado, Ponto de Partida! Obrigado, Artistas (no sentido original da palavra)! Parabéns sempre! E quem quiser assistir e conhecer ‘Grória Figena’, não perca a oportunidade de conhecer uma mulher cômica, respeitosa e sincera. Indico!