segunda-feira, 13 de julho de 2015

O custo do trabalho



Bruno, como tantos homens no começo dos trinta, vive pra sua carreira, trabalha demais e está sempre cansado. Chega em casa com o corpo tão moído e o cérebro tão entorpecido que não consegue fazer nada de útil ou produtivo a não ser se embatatar diante da TV e zapear entre seriados.

Quando fui visitá-lo, tinha acabado de comprar o DVD da primeira temporada da Super-Máquina, uma das séries mais idiotas da década de oitenta. Para assistir as aventuras de um agente secreto cabeludo que viaja pelos EUA resolvendo crimes com seu carro falante inteligente, Bruno pagou duzentos reais.

Entre confidências de fim de noite, confessou admirar minha vida. Disse querer muito ver a vida como vejo, não dar tanta importância às coisas bobas, saber relaxar mais, viver de forma simples e serena.

Respondi que viver a minha vida era muito fácil. Trabalhar menos, gastar menos, nada poderia ser mais simples. Mas tinha um preço: era preciso sair do circo de consumo. Abdicar de ser consumidor.

DVD da Super-Máquina tinha sido comprado com duzentos reais que ele ganhara trabalhando quinze horas por dia, às vezes seis dias por semana. “Eu mereço uma diversãozinha leve!”, ele disse para si mesmo. Afinal, o DVD custara somente meia hora do seu trabalho, um sacrifício ínfimo.

Para fins de comparação, nessa época, ganhava sete reais a hora num cursinho de inglês do subúrbio. Eu teria tido que trabalhar trinta horas para comprar esse DVD.

Então, se ele trabalhasse menos e ganhasse menos, se não tivesse um trabalho com tanta pressão e com tantas responsabilidades, não teria duzentos reais dando sopa assim para gastar em besteira. Provavelmente, teria que investir esses duzentos reais em arroz, feijão, leite, batata.

Mas, por outro lado, se não trabalhasse quinze horas por dia, às vezes seis dias por semana, em um emprego massacrante que lhe sugava a alma e lhe cuspia de volta em casa completamente incapaz de qualquer atividade remotamente produtiva, ele não estaria sempre exausto e não precisaria anestesiar sua consciência assistindo DVDs de seriados idiotas.

É tudo uma coisa só, una, indivisível, duas partes inextricáveis do mesmo mecanismo: o mesmo mercado que te possibilita os meios de consumir é o que faz vocêprecisar consumir.

De um modo bem real, Bruno não tem “tempo livre”. Quando não está trabalhando, está descansando o cérebro de tanto trabalho e se preparando para poder trabalhar mais. Mesmo quando está longe do trabalho, seu tempo é sempre definido em função do trabalho.

Por Alex Castro

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