por Léo Luz
Eu nunca entendi de onde veio essa coisa do amor à primeira vista.
Procurei no Google e não achei nada sobre os primeiros relatos
literários do amor à primeira vista. Parece que ele sempre existiu.
Sempre existiu, mas nunca fez sentido, convenhamos. Nunca fez e ainda
não faz. Eu não confio em gente que se apaixona à primeira vista. Não há
nenhum critério no amor à primeira vista. É o mesmo que comprar um
carro sem olhar o que tem dentro, ou que comprar uma casa sem nunca
tê-la visto por dentro. Repito: não faz o menor sentido.
E além de não fazer sentido, não é nada romântico. Você se apaixonou
por um corpo. E ponto. Ela pode ser gaga, fanha, ter só um rim, pode
colocar o feijão embaixo do arroz, pode preferir Star Trek a Star Wars,
pode gostar dos Strokes ou pode até – Deus nos livre – bagunçar
o seu jornal todo dia de manhã antes de você ler. Ele pode ter três
gatos, pode ter um mullet, ter só uma calça jeans e cinco camisetas,
pode ser daqueles que vai trabalhar de bicicleta com short neon justo ou
pode até se juntar com os amigos pra recitar poesia concretista às
sextas-feiras em alguma praça. Quem se apaixona à primeira vista corre
esses riscos.
Quem se apaixona à primeira vista não vive a experiência da evolução
do “até que no fim da noite, bêbado, eu pegaria ela” para o “se eu vir
mais uma comédia romântica eu me declaro pra ela!”. Quem se apaixona à
primeira vista não vivencia a idiotice de achar lindo quando ela tropeça
no fio da impressora, derruba 100 folhas, deixa o celular cair e ainda
consegue voltar pro lugar dela com aquele sorriso lindo, como quem diz:
“gente, o que eu posso fazer se eu sou fofa até provando um desastre
nuclear?”. E isso sim é o bacana do amor. Isso É o amor. É perceber,
meses depois, que quando vocês se conheceram você nunca havia prestado
atenção nele, até que um dia começou a tocar “ain´t she sweet” e tudo fez sentido.
Ouso dizer até que paixões à primeira vista duram menos. Aquele
primeiro tombo dela na mesinha do telefone, é algo completamente fofo e
“óin” quando você está se apaixonando, mas pode ser constrangedor quando
você já está absolutamente apaixonado. Porque, afinal, você não se
apaixonou por aquela desastrada, tímida. Você se apaixonou pela imagem
dela, lá, parada, à primeira vista, sem dizer nada. É essa que você ama.
É com essa que você quer se casar. Você nunca soube o que era o
primeiro calafrio depois de muito tempo que vocês se conhecem. Você não
sabe o que é dizer para os amigos: “quem diria que um dia a gente ia se
apaixonar”. Você não sabe o que é, depois de meses e meses convivendo
com a (suponhamos) Alice, se apaixonar e reviver mentalmente todas as
vezes que vocês se viram e não estavam apaixonados, e pensar: “como é
que eu pude demorar tanto tempo pra me apaixonar pela (hipoteticamente,
de novo) Alice?”.
Se você tivesse se apaixonado pela nossa hipotética Alice à primeira
vista, tudo seria diferente. É a sutil diferença entre “gente, como ela é
linda, desastrada e atabalhoada desse jeito!” e o “..., como
eu ia adivinhar que aquela gata por quem eu me apaixonei era assim
estabanada e bagunceira?”. Ah, e a diferença entre ter uma estória
apaixonante e empolgante de encontros e desencontros para contar aos
netos e ter um “a gente se apaixonou à primeira vista”, e fazer os seus
netos sofrerem bullying na escola por terem avós sem criatividade. Tudo
pelos netos.
Léo Luz
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