"Existem
momentos na vida onde a questão de saber se pode pensar diferentemente do que
se pensa, e perceber diferentemente do que se vê, é indispensável para
continuar a olhar ou a refletir." - Michel
Foucault
Uma poesia coreografada sobre a linha tênue entre o que é padronizado
como loucura e normalidade! O Grupo de Dança Primeiro Ato em sua estreia com a
apresentação de Só Um Pouco A.Normal
possibilitou uma breve, singela e educada reflexão sobre o processo
enlouquecer, se é que há um processo. Acredita-se que temos certa dose de
loucura, mas ao contrário do que muitos pensam talvez a sanidade mental seja
apenas uma pequena característica dominante de nosso caráter.
A coreografia e concepção de Wagner Moreira nos faz considerar o que é
continuamente discutido nas literaturas sobre saúde mental: o sistema nos cobra
a sanidade mental com suas regras, leis e condutas, mas nos comprime à
‘anormalidade’ de forma feroz através de suas contradições. Questões peculiares
são colocadas em pauta: Ser ‘normal’ é atender a todo estereótipo imposto pela
sociedade? É estar constantemente preocupado com o complexo ‘tenho que ser’? Ser um diferente
padronizado? O que é loucura? Como diagnosticá-la? Como ter certeza de que os
que na verdade estão gozando de sua plena sanidade mental são os que
consideramos loucos?
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Fotografia: Marcello Nicolato |
A pesquisa para a realização desse espetáculo não poderia ter outro plano
de fundo que a história curiosa da loucura em Barbacena. Provavelmente, os
pacientes psiquiátricos dessa cidade ao assistirem esse trabalho se sentiriam
como sendo refletidos em espelhos. Nestes espelhos, se enxergariam em corpos
artísticos, criativos, disciplinados, ‘anormais’. Seus pseudônimos seriam Lucas
Resende, Pablo Ramon, Verbena Cartaxo e Vanessa Liga. Sem dúvida, esses nomes
não serão esquecidos, pois um ballet inenarrável como o deles não pode se
perder nas gavetas de nossas memórias. A harmonia musical de J.S Bach nos leva
ao ápice da emoção. Que Suely Machado continue ‘tecendo encontros’ como o que presenciamos neste espetáculo! Não
se pode esquecer que o sucesso desse brilhante espetáculo se deve a toda Ficha
Técnica do Grupo Primeiro Ato e parceria com o Grupo Ponto de Partida.
Edson Brandão está certo, se a loucura é como realmente pintamos talvez
sejamos ‘o outro lado da moeda’. A loucura é realmente paradoxal. Como
diferenciar um louco, se este ‘estado’ é confuso e muitas vezes imperceptível
aos olhos humanos? O louco da história pode ser você que lê este texto, ou a
plateia que assistiu ao espetáculo do Grupo Primeiro Ato. Louco é sempre aquele que faria o que não
temos coragem de realizar, ou não queremos, não gostamos. É como disse
Foucault, ‘a loucura só existe em relação à razão’. E como será que um louco
define razão? Provavelmente viver num
‘mundo paralelo’ seja a melhor saída!
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